Poemas Místicos
sobre arte e criação
Colheita
Como vivem, morrem e caem
as folhas e os frutos
vivem, morrem e caem
os versos no papel
e brotam e se movem
pelo interior dos leitores.
29-12-84
Criação
Quantas palavras
Quantos poetas
Quantos caminhos
portas secretas...
29-08-84
Alguns frutos
Alguns poetas
brotam brandos e puros
crescem belos e fecundos
(alguns revoltam-se)
e murcham amargos
secos e sós.
09-04-85
Senhor
O escritor
dá o destino
dos vivos, dos mortos
do mal
dos mal-amados
com a mão
E quem comanda
a criação?
17-04-85
Artífice
O artista às vezes é
um pouco parente da gente
temos os traços de um
e os braços de outro
seguimos o gesto de algum
e o trajar de todos
- Sou prima de poeta
irmã de artesã
- Ah, como é bom ser artista
e ter mágica na vista!
Enriquecem nossos casebres
em brochura, gravura,
gravações, aparelhos
No retrato nome, sobrenome,
e assinatura
(que pedimos de joelhos)
Mesmo assim nos amam
são familiares
(que nunca temos)
precisam de nossos olhares
devemos dizer que os cremos.
(Os versos são para um avô
que me levou a versar).
17-04-85
Voto visionário
Os centésimos de segundo
não param
não esperam por você
voe até eles
e vaze o amanhã.
27-04-85
Uma confissão sem perdão
Somos larápios
emprestando poesia de outros
pra coroar nossa prosa
(que mal fala da rosa)
querendo engolir
as células dos sábios
Poe, toma teu terror
Pessoa, resgata vossa(s)
multiplicidade(s)
Blake, fecha as portas
Eliot, Shakespeare, Bandeira
rasguem toda a rota
se acharem-na torta,
Todos.
29-04-85
Hino-utilidade
De que adianta
ter-se
aviões, poetas,
lindas faces,
se não se sabe
como respirar ?
03-05-85
Pós-visão do brilho
Acho que sei
como quebrarão meus encantos
Acho que sinto
Como vazará meu instinto
serei como o poeta-suicida
findarei e voltarei
respiro após respiro
terei muitas vidas,
terei poucos anos,
talvez
Quantas vezes brilha
aquela luz
antes e depois?
07-05-85
Filme sem Fim
Quem não lembra
dos olhos de Gary Cooper?
Quem não apalpou as pernas
de Marlene Dietrich?
Glauber Rocha (foi?)
(e o vento, levou?)
Quantas tramas temos?
A trama sem nação
A terra sem tela
Os milímetros de emoção (antigos)
As calamidades de botões apertados,
O que revelaremos
da derradeira arte?
(Vamos parar em cena?)
09-05-85
Arte & Vendas (menos místico)
Procure as linhas
entre as entrelinhas
de uma música-comercial:
temos o romantismo-tablóide
de cifras e chifres
de um galã-de-novela
só as peças permanecem
aparente(mente) que é assim
“But what sells, sells.
That’s the law.”
Tradução simultânea:
“Mas o que vende, vende.
Esta é a lei.”
25-05-85
Pirâmides Permanecem...
Nas primeiras pirâmides
escondem-se os segredos
dos sangues, das dores, das crenças
-Uma pedra por cada vida!
Hoje, as pirâmides da polis
são tumbas isoladas
idolatradas, atadas
onde pequenos faraós
se enterram com ouros
de papel
- Cada vida por uma pedra!
26-05-85
Primeiro livro, última folha
A matéria
acaba,
mas não o
pensamento.
O espaço
Está em
N ó s.
27-05-85
O bacana de ler os teus poemas é que se percebe na grande maioria deles que ainda pulsa o inconformismo, que é a mola que move não só a poesia, mas toda a literatura.
ResponderExcluirTem coisas antigas aqui que permanecem surpreendentemente atuais. Essa é a marca, a tua marca. Não deixe que isso se perca nas gavetas do esquecimento. Vc tem as ferramentas.
O que vende, vende - essa é a lei. Mas aquilo que é oferecido não tem preço.
Bjs!!!
Em visita. Lendo aos poucos. Abraço,
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