sexta-feira, 11 de setembro de 2009

... Silêncio

Tempos Urbanos:



poemas de cidade

grande e pequena



Velocidade

Cada instante corre
para ser fotografado
captado pela objetiva da vida
Ódio e amor na cidade
onde os carros são o amor
e as pessoas são o ódio.

09-09-83


Luz-Dormente

A cidade cala
no escuro fala
neutra em anúncios

o que se vende!
o que se surpreende!
o que se compreende ?
até o dia
que se estende ...

um som surdo propaga
a calmaria, a paga
da noite ser viva
do dia ser morto

Quantas luzes se calam
dentro de nós ?

27-03-85

A Borboleta no asfalto

A borboleta voa
no solo da cidade
se arrasta pelo azul
do sonho da metrópole
espremida entre os espaços
do medo, da crueldade
do vão da fragilidade.

(A borboleta sonha ser um leão)

09-02-85


Viagens

Vejo São Paulo
de óculos escuros
e Miami
de céu azul
com olhos lavados
de poluição
e o peito em premissa
de emoção.

20-02-85


Ci-dade


Cidade,
caridade...
“Cara cidade:”
Cai a cidade
dada a idade
de cada cavidade
cai a vaidade
Cadê a cidade ?

20-02-85


Áreas

E lá estacionamos nós
robôs de lanchonete
comendo a mesma carne
deglutindo o mesmo doce
o passo parecido
à moda moldados
os cabelos cortados

(Pareço minha pera
em meio ao produto)

Mas as idéias,
anormais, iguais, contrárias
nos embalam com árias
de interiores distintos.

15-03-85


Noite


...(Uma luz longa e lânguida


leva seus lábios aos lares


em beijos, desejos e consumo)...

27-03-85


Tarde no centro da cidade


Divago, vago
um poema na cabeça
e poeira nos pés ...

09-04-85


À noite
ouço vozes
Vozes de vivos
vozes de tv
vozes de cães,
de canções
vozes minhas
vozes de aviões
em linhas
voando sobre nossas
vozes sem direções
vão e voltam
em volumes vários
de vales, de valas
de vilas
de varões, valetes
de voil, de seda
(tudo igual)

que valor têm
vozes movendo assim,
pulsando em volta de mim ?

10-04-85


Agonia de um país

O que se decide
por trás das portas
de capitais
por trás das portas
dos hospitais
o presidente vive
ou morre ?
o que será de nós,
pobres mortais ?

10-04-85


Grandeza

O complicado, o complexo
o simplificado
ciscam desde o chão do concreto
demarcado, riscado, arriscado
“O fabuloso poder do pecúlio”
E nós ?
Somos espelhos sujos
da opulência
de face nobre e pobre.

12-04-85


Nem lembrança ?

O mato domina
a moradia abandonada
será que está morta a mina?
será que não há mais nada ?

19-04-85


Sal Sujo (seja a sujeira da cidade)

O pó preto (ou dourado, verde
ou cor de metal)
aprisiona o real, o irreal
e até o belo sal
(nos bares)
fica na imundice total.

19-04-85


Excursão perdida

Quando ouço os jovens
no seu ensejo
(o vendedor e o papagaio)
vôo para vidas que não vejo

“Quer saber a sorte, moça?”

Quantos de nós
já não viveram
num país de realejo?

19-04-85


Lugares


Los Angeles
São Paulo
Paris,
New York

todas batem
dentro de mim
todas existem
(entre pontes)
no pico do prédio
no carro do rico
no mendigo
na mulher...
na prostituta
nas rédeas
de nossas mãos
sem brilhantes
nas sessões
dos homens de negócio

Os veículos – valem mais
que os vínculos

Quero trilhar
tudo do alto
e tocar o asfalto
com vossas valias.

21-04-85


Rodo

Que sincero pôr-do-sol de sexta!
todos esperamos pelo ônibus de 24 horas
amanhã quem sabe vamos sair
moleques maltrapilhos mendigam menos
evitamos até as tragédias, os trabalhos
as várias rodoviárias
que nos viram em passagens
e caretas para tudo.

26-04-85


Limites ou Alturas ?

É a primeira vez
que vejo as vilas do alto
nem estou no chão
nem dei um salto
tetos ornam os templos
os cabelos barram-me as retinas
como cortinas
que nos separam
de outros espaços

Até onde nos confinam os limites?

05-05-85


História do Movimento

Primeiro foi a biga,
depois a carruagem,
a bicicleta,
o carro

Ser inteligente
continua andando a pé
em protesto
em passeata
em parada
e a buzina é também bandeira.

06-05-85


Potência ou Inocência? (segredos)

O combustível caminha pela calçada
O homem (muito comum)
desliza pelo asfalto
nunca se sabe
quem é mau
quem é controlado

(O pano sempre cobre
o monumento
antes dele ser
mostrado.)

10-05-85


Av. Brasil
(Centro)

O nome do governante
do ente, antes doente
é ainda pendente
no muro que marca o futuro (?)


19-05-85


Papel-
Câncer-
Concreto

A pólis se propaga
como um câncer
pleno de apanhadores
de papéis.

19-04-85


Só tenho um retrato
do meu ante-passado
hoje é foto-instantânea
reveladora (?), re-velada,
um instante basta
pra construir o momento
pra corroer o guardado.

24-04-85

Um comentário:

  1. "Quantas luzes se calam
    dentro de nós ?"

    Quando disse lá em Paraty que tenho verdadeira inveja de vocês que escrevem poesia, não estava mentindo.

    Acabei de atravessar uma esbórnia de poemas belíssimos, nos quais você faz o tempo inteiro o contraponto cidade-concreto-emocional.


    Não é por acaso que a borboleta quer ser leão.

    Bjs.

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